domingo, 25 de outubro de 2015

A RUA, O QUE SOBRA PARA OS EXCLUÍDOS


Professor Luizinho Aguiar

Neste país, de tantos contrates uma cena já faz parte da paisagem brasileira, que de certa forma nos envergonha, pelo fato de sermos um país rico, possuindo um dos principais PIB - Produto Interno Bruto do mundo o quinto em extensão, constatar que em quase todos 5.565 municípios existem um contingente de excluídos, os moradores de rua.
Será que alguém em sã consciência gostaria de morar nas ruas, em baixo de pontes, viadutos? Acredito que não. A globalização e o avanço tecnológico que tem alcançado diferentes sociedades têm gerado consequências negativas, configuradas na reprodução de desigualdades sociais e na falta de garantias sociais para grande parte da população. Em pleno século XXI, constata-se que a civilização ao longo dos anos não foi capaz de constituir um pacto que trouxesse melhorias sociais. As últimas quatro décadas foram decisivas para a mudança nas características da sociedade ocidental. Com intuito de aumentar seus lucros ainda em patamares maiores, as grandes empresas fizeram grandes investimentos em tecnologia de ponta, diminuindo consideravelmente os índices de emprego, é bem verdade que neste contexto já não há vagas suficientes, até mesmo para pessoas com ensino médio e superior que aumentam as filas dos desempregados. Sem empregos, há pouco espaço para a vida vivida como projeto.
Sem trabalho não há honra como canta Raimundo Fagner, desempregados, desiludidos a massa vai se tornando vulnerável, o próximo passo é a forma mais aguda, a exclusão social. A opção que resta, como denomina Castel (1997) aos sobrantes, pessoas normais, mais inválidas pela conjuntura capitalista, como decorrência das novas exigências da competitividade e da redução de oportunidades e de emprego. Nesse contexto que se insere a população em situação de rua. População heterogênea, compostas por pessoas com diferentes realidades, mas que tem em comum a condição de pobreza absoluta, a miséria. Já não se sentem como componentes da sociedade formal.  São os excluídos por não conseguirem alimentar seus filhos, pagar seus aluguéis, sem paredes e tetos, não lhe resta outra saída, como diria Drummond e agora José a festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, só lhe resta a solidão, mulher já se foi não aguenta mais essa situação.

 Se formos fazer uma radiografia dos moradores de rua, vamos encontrar uma amalgama complexa de definir quem são os moradores de rua, porém, não é tão difícil constatar algumas características estruturais comuns a esses irmãos brasileiros excluídos. São homens, mulheres, jovens, famílias inteiras que de algum modo sofreram algum tipo de infortúnio, resultado da desagregação progressiva das proteções ligadas ao mundo do trabalho, rompimento de algum laço afetivo, fazendo com que aos poucos fossem perdendo a perspectiva de projeto de vida, passando a utilizar o espaço da rua como sobrevivência e moradia. A perda de vínculos familiares, decorrente do desemprego, da violência, da perda de algum ente querido, perda de auto-estima, alcoolismo, drogadição, doença mental, paixão não correspondida que deixa a pessoa sem o poder de reagir, nesse caso é muito mais presente no comportamento do homem, entre outros fatores, é o principal motivo que leva os indivíduos a morarem nas ruas. São histórias de rupturas sucessivas e que com muita frequência, estão associadas ao uso de álcool e outras drogas ilícitas, não só pela pessoa que está na rua, mas por outros membros da família. É muito comum também encontrar pessoas que deixaram suas cidades para aventurar-se nas grandes capitais, sem instrução nem uma preparação que possa contribuir para adquirir alguma renda, passa a viver de biscates unicamente para conseguir o alimento do dia, com o passar do tempo a situação vai piorando, doenças oportunistas vão se apoderando do corpo debilitado, que não consegue ingerir calorias suficientes que o corpo exige. Sem a capacidade de ergue-se vão se entregando as relações promíscuas com colegas que o destino lhe propiciou, dessa relação resulta doenças infecciosas como a AIDS e outras. Também é comuns encontrar jovens mulheres grávidas que vão proliferar não só gente, mas, sobretudo mais problemas mais tristezas e pena aos abastados que transitam cotidianamente pelos grandes centros das grandes cidade desse imenso país.
Os moradores de rua são os excluídos da sociedade, que pela lógica de acumulação de riqueza, pelo individualismo sistemático, egoísmo que impede de ver no outro seu irmão, pela ausência de políticas públicas reparadoras, pela desagregação familiar, como resultado dos tempos atuais, onde os valores fundamentais que são aprendidos na convivência familiar, não são vividos, até porque a família brasileira vai desintegrando numa velocidade assustadora, a maioria das pessoas não quer mais constituir famílias, as relações são efêmeras, “ficantes” como dizem os jovens, mal sabem eles que num futuro bem próximo é algum membro da família que poderá socorrer quando for acometido por doenças e precisar de apoio num leito de hospital. Por tudo isso, a cada ano vai aumentando a população de rua, foi só o que sobrou de vidas dilaceradas pelo sistema, pela desagregação da família, pela insensibilidade de governos incompetentes, corruptos que só pensam em si. O que nos acalenta um pouco, são atitudes de voluntários, geralmente jovens preocupados com esses desfavorecidos, que através de projetos altruístas mitigam a dor daqueles que apenas a rua sobrou.  
Nossa vida não é um caminho retilíneo, na luta pela sobrevivência nos deparamos com muitas situações que são resultado, muitas vezes de escolhas infelizes, outras são impostas por um sistema que pela própria natureza de acumulação relega aqueles que não tiveram oportunidades na vida, a esses sobrantes mais que de alguma forma tiveram um pai uma mãe de certo que não acompanhou a vida do filho ou da filha, são os abandonados socialmente e familiarmente, sem suporte de quem deveria dar, vai descendo materialmente, moralmente ladeira abaixo, sem nada para encostar, olhar frio de alguns, piedade dos outros, e assim milhares de vidas vão definhando, sem sonhos, sem motivação o que lhe resta apenas o teto azul democrático do céu. Não podemos dizer de forma nenhuma que vivemos numa democracia, quando brasileiros nascidos neste torrão, só resta o chão da rua, o frio e a falta de pão, em alguns casos raros a mão estendidas daqueles que ainda se compadecem da dor do irmão.
REFERÊNCIAS
BAUMAN, Zigmunt. O mal-estar da pós-Modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
BULLA, l C; MENDES, J. M. R.; PRATES, j. C (Orgs.). As múltiplas formas de Exclusão Social. Porto Alegre: federação Internacional de Universidades Católicas: EDIPUCRS, 2004.      

Maués, 21 de outubro de 2015
Professor Luizinho Aguiar.

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